As teias da paixão

Carmen

Ópera em quatro actos do compositor francês Georges Bizet, com libreto de Henri Meilhac e Ludovic Halévy. Baseia-se na novela homónima de Prosper Mérimée (publicada em 1845) e que terá sido possivelmente influenciada pelo poema narrativo The Gypsies (1824) de Alexander Pushkin.

Bizet começou a compor Carmen em 1873, mas a estreia seria apenas em 03/03/1875, no Opéra Comique de Paris e representaria um escândalo no meio musical parisiense, principalmente para o público conservador daquele teatro. Esta é uma obra altamente original e influente que combina as tradições do opéra-comique (diálogo falado) com um realismo emocional bastante marcado (Verismo).
Apesar do insucesso inicial, a magia de Carmen acabaria por exercer o seu poder de sedução com encantadoras melodias, exotismo e força das personagens. Ganhou a admiração de compositores como Saint-Saens, Tchaikovsky, Brahms, Wagner e até do filósofo Friedrich Nietzsche.
Infelizmente, Bizet morreria tragicamente três meses após a estreia, desconhecendo o sucesso que a ópera teria.
Hoje em dia é uma das óperas mais amadas em todo o mundo.
Muitos compositores utilizaram temas de Carmen como base para o seu próprio trabalho tais como: Pablo de Sarasate em Carmen Fantasy (1883), Franz Waxman em Carmen Fantasie (1946), Vladimir Horowits em Variations on a theme from Carmen, Ferruccio Busoni em Sonatina n.º6 : Fantasia da Camera super Carmen (1920).


Numa praça de Sevilha onde se situa um quartel, alguns militares observam os transeuntes. Micaela aproxima-se, procurando por Don José mas informam-na que ele só estará presente ao render da guarda. Os militares insistem para que se junte a eles enquanto espera, mas a jovem resolve regressar mais tarde.
É a hora do render da guarda e Don José chega acompanhado do tenente Zuniga. Este último diz-lhe que uma bela rapariga andou à sua procura e Don José pensa que deve tratar-se de Micaela (uma orfã que foi acolhida por sua mãe). Zuniga fala-lhe também das mulheres que trabalham na fábrica de tabaco mas Don José só pensa em Micaela e acaba por confessar que gosta dela.
Entretanto, o sino da fábrica anuncia o intervalo. As portas abrem-se e o fumo espalha-se pela praça. As operárias saem fumando os seus cigarros. Entre elas está Carmen, uma bela cigana (o protótipo da mulher fatal).
Ela é livre, independente e senhora das suas decisões. O seu forte temperamento e poder de sedução faz com que os homens se rendam aos seus encantos. Carmen canta a boémia, a liberdade e a paixão, definindo o amor como um pássaro rebelde que não se pode aprisionar:

“L’amour est un oiseau rebelle
Que nul ne peut apprivoiser,
Et c’est bien en vain qu’on l’appelle,
S’il lui convient de refuser…”


Em sinal de desafio e antes de regressar à fábrica, Carmen atira uma das suas flores a Don José deixando-o francamente perturbado. Ele é um homem desconfiado por natureza mas que acaba por se render às “teias” da paixão quando conhece Carmen.
Micaela surge novamente à procura de Don José trazendo-lhe uma carta de sua mãe. Antes que este comece a lê-la, a rapariga afasta-se dizendo que voltará mais tarde para saber a resposta. Ao ler a carta, Don José promete para si próprio que fará o que sua mãe lhe pede: casará com Micaela.
Entretanto, começa um tumulto no interior da fábrica. Duas mulheres envolveram-se numa briga e entre elas está Carmen que desferiu alguns golpes numa colega, deixando-a ferida.
Zuniga ordena a Don José e aos seus homens que prendam a agressora, mas a sedutora cigana consegue fazer com que ele se torne seu cúmplice, ao prometer-he o seu amor. Carmen acaba por conseguir fugir e Don José é preso por ter permitido a sua fuga.
Na taberna de Lillas Pastia, Carmen está na companhia das suas amigas e alguns oficiais, entre eles Zuniga. A cigana espera por Don José que acabou de conseguir a sua liberdade.
Ouvem-se manifestações de júbilo, é Escamillo – o famoso toureiro, que se aproxima. Ao ver Carmen, fica deslumbrado com a sua beleza e começa a cortejá-la.
Lillas Pastia pede a todos os presentes que saiam, pois está na hora do fecho. Na realidade ele aguarda a chegada de Dancaire e Remendado, dois contrabandistas que têm uma proposta para fazer a Carmen e suas amigas. Ao ouvir a proposta, a cigana começa por recusar mas acaba por mudar de opinião perante a possibilidade do seu apaixonado também participar na operação de contrabando.
Finalmente chega Don José e Carmen tenta convencê-lo a juntar-se a ela e aos contrabandistas. Don José recusa mas Zuniga aparece repentinamente para o atacar. Dancaire e Remendado conseguem neutralizá-lo e desta forma, obrigado pelas circunstâncias, o soldado vê-se forçado a desertar e parte com a cigana.
Num desfiladeiro, os contrabandistas fazem os preparativos para a entrega dos produtos. Carmen e D. José não se entendem um com o outro e a cigana diz-lhe que já não gosta tanto dele. Descontente com a sua vida, ela resolve adivinhar o seu futuro com as cartas, que acabam por revelar um mau presságio: A morte.
Com a ajuda de uma guia, chega Micaela com a esperança de convencer Don José a voltar para casa de sua mãe. Entretanto ouve-se um disparo. Um intruso aproxima-se e por pouco não é baleado, trata-se de Escamillo, que desconhecendo a identidade do seu interlocutor (Don José), lhe conta que está à procura de Carmen por quem está perdidamente apaixonado.
Os dois envolvem-se numa disputa que é interrompida pelos contrabandistas e Escamilho acaba por abandonar a cena.
Micaela, que logo após os disparos se tinha escondido é agora descoberta por um dos contrabandistas. Ao sair do seu esconderijo, pede a Don José que a acompanhe pois sua mãe está a morrer. Ele acompanha-a e despede-se de Carmen prometendo voltar.
Em Sevilha, em frente à praça de touros todos aguardam a chegada dos toureiros. Uma amiga avisa Carmen que Don José se encontra por perto e que ela deverá partir mas a cigana recusa.
Quando finalmente se encontram, Don José pede a Carmen que volte para ele, ela recusa dizendo-lhe que o seu coração pertence a outro e atira-lhe o anel que Don José lhe oferecera. Cego de ciúme, ele atinge-a mortalmente com uma faca.
Assim que se apercebe do seu acto tresloucado, ajoelha-se arrependido junto ao corpo da amada, confessando o crime.


Fim de temporada com chave de ouro, no São Carlos !
Foi sem dúvida a melhor ópera. Talvez por isso, os bilhetes tenham esgotado (segundo ouvi dizer).
A música é soberba e logo aí…temos de nos render…!
Intérpretes e orquestra proporcionaram excelentes momentos musicais. Os cantores eram muito bons especialmente Rinat Shaham (Carmen) e Andrew Richards (Don José).
Carmen teve uma excelente interpretação, tanto a nível lírico como dramático, tendo encarnado muito bem o papel da sedutora cigana que enfeitiça os homens; entre eles Don José , um homem dividido entre o amor por Micaela e a paixão fatal que sente por Carmen.





Sobre o compositor – Georges Bizet (1838 / 1875)


Georges Bizet nasceu em 25 de Outubro de 1838, em Paris.
O seu pai era professor de canto e a mãe era pianista (foi dela que recebeu as primeiras lições de piano).
É com o incentivo familiar que entra para o Conservatório de Música de Paris, muito precocemente (aos nove anos de idade). A partir daí começa a destacar-se como intérprete e compositor.
Em 1855, com apenas 17 anos compõe a Sinfonia em Dó Maior. Dois anos mais tarde é agraciado com um prémio oferecido por Jacques Offenbach pela ópera cómica Le Docteur Miracle.
Em 1858 Bizet vai estudar para Roma. Durante esse período compõe a ópera buffa Don Procopio. 
Em 1860 regressa a Paris e dedica-se inteiramente à composição. Nesse mesmo ano começa a compor a Sinfonia Roma em Dó Maior, cuja estreia seria apenas em 1868.
Em 1863 compõe a ópera Les Pêcheurs de Perles (sua primeira grande obra). Dessa época é também a ópera La Jolie Fille de Perth, a famosa Suíte L'Arlesienne, a peça para piano Jeux d'enfants e a ópera Djamileh.
É em 1875 que Bizet compõe a sua última e mais famosa ópera: Carmen, que é uma das mais representadas em todo o mundo. Escrita com base na novela homónima de Prosper Mérimée, a composição de Carmen teve a influência de Giuseppe Verdi, usando uma mezzo-soprano como personagem principal - a cigana Carmen. Na altura da estreia, Bizet foi acusado de "Wagnerismo".
Não teve êxito imediato, apesar do mérito reconhecido por compositores como Saint-Saëns, Tchaikovsky, Debussy e Brahms que considerou Carmen como a maior ópera produzida na Europa desde a Guerra Franco-Prussiana.
Bizet não viveu o suficiente para ver o sucesso da sua obra pois morreu de ataque cardíaco aos 36 anos de idade, três meses após a estreia de Carmen.
Foi sepultado no Cemitério do Père-Lachaise, em Paris.
Embora tenha ficado famoso como compositor, Bizet também foi um grande pianista, elogiado inclusive por Franz Liszt, que o considerou um dos melhores executantes de toda a Europa.
Este músico dotado viu a carreira "travada" devido às suas próprias inseguranças. A procura pela perfeição era constante, o que fez com que deixasse muitas obras inacabadas. Cerca de quarenta óperas nunca passaram da fase de esboço.
Das óperas que Bizet conseguiu terminar, nenhuma conseguiu atingir a fama de Carmen. Aliás, é a ela que Bizet deve a sua celebridade póstuma.
Com Carmen, Bizet mudou o curso da ópera francesa iniciando um estilo dramático realista com música cheia de sensualidade que atingiu o clímax décadas mais tarde.

Lindíssima abertura a desta ópera:

http://www.youtube.com/watch?v=PQI5LtRtrb0&feature=related