Emoção...Beleza...Sentimento

Cavalleria Rusticana


 Baseada na novela com o mesmo nome, do escritor Giovanni Verga e com libreto de Giovanni Tragioni-Tozetti e Guido Menasci, esta ópera (com apenas um acto) é a mais conhecida de Pietro Mascagni.
Após ter ganho em 1889, a prestigiada competição da editora Sonzogno, Cavalleria Rusticana estreou-se um ano depois, em 17 de Maio de 1890, no Teatro Constanzi em Roma. O sucesso foi imediato e Mascagni tornou-se subitamente famoso.
É considerada uma ópera pioneira no que se tornou conhecido como o estilo verismo (realismo), movimento que juntou jovens compositores italianos (influenciados pela Carmen de Bizet e pelos romances de Émile Zola e Balzac). As atenções desses jovens, eram dirigidas para episódios violentos e emocionais da vida moderna, normalmente centrados em personagens proletárias ou camponeses.
Para reforçar o realismo de Cavalleria Rusticana, o compositor musicou a linguagem da peça ao estilo da canção popular.
Sob influência desse movimento, grande parte da partitura da ópera é escrita com a intenção de imitar a voz falada. As notas agudas são utilizadas para marcar momentos de grande tensão emocional.
Praticamente toda a partitura está construída de forma alegre e colorida, no entanto esta é uma obra trágica. Temos coros magníficos, que dão vivacidade e cor à peça, mas temos também árias e duetos que dão um tom mais pesado e dramático à obra.
Cavalleria Rusticana evoca de forma realista, a vida de uma aldeia siciliana, nos finais do Séc. XIX, onde o amor, a traição e a honra são os ingredientes de uma tragédia anunciada.
Esta é pois, uma poderosa história de amor proibido, traição e vingança.

Logo depois do imponente prelúdio, a acção começa com a voz de Turiddu ao longe, que canta em nome da paixão que sente por Lola.
Toda a aldeia está em festa. Mulheres e homens manifestam a sua alegria:

“As laranjas cheiram bem
Nos verdes campos,
As cotovias cantam
Entre as murtas em flor;
É tempo de cada um
Murmurar a terna
Canção que faz redobrar
O palpitar do coração”


“No meio do campo,
Entre as espigas de ouro
Chega-nos o som
Das vossas lançadeiras;
Cansados
Repousando do trabalho,
Pensamos em vós,
Belos olhos de sol.
Corremos para vós
Tal como o pássaro voa
Ao encontro do chamamento”


Santuzza não partilha este animado estado de espírito. Preocupada, aproxima-se da hospedaria de Mamma Lucia e pergunta-lhe pelo seu amado, Turiddu. Mamma Lucia diz-lhe que o filho não se encontra ali, pois foi buscar vinho a Francofonte. É essa a resposta que dá também a Alfio, quando este lhe solicita uma taça de vinho. Alfio fica surpreendido, pois viu Turiddu perto de sua casa. Mamma Lucia não entende como é isso possível, mas Santuzza faz-lhe sinal para se calar.
É chegada a hora da procissão da Páscoa da Ressurreição, o povo entoa o hino Regina Caeli Laetare.
Santuzza fica a sós com Mamma Lucia e visivelmente consternada, explica-lhe o seu sofrimento.
Segue-se o conhecido solo de Santuzza "Voi lo sapete, o mamma".
A rapariga conta que antes de fazer-se soldado, Turiddu amava Lola, mas quando regressou à aldeia, ela já tinha casado com Alfio. Na tentativa de esquecer e substituir aquele amor, Turiddu aproximou-se de Santuzza. Lola não ficou satisfeita com a situação e invejosa daquela felicidade, seduziu Turiddu.
Mamma Lucia fica chocada com aquela revelação e antes de entrar na igreja, pede ajuda divina.
Chega Turiddo. Este dueto entre os dois é um dos momentos mais carregados de todo o drama. Santuzza pergunta-lhe onde esteve e implora-lhe que não a deixe. Turiddu dá-lhe pouca importância, despreza-a e vira-lhe as costas, entrando na igreja. Enraivecida, ela amaldiçoa-o e resolve contar toda a verdade a Alfio, que se cruza com ela, pouco depois. Este jura vingança.
Santuzza fica sozinha.
Inicia-se um dos momentos mais belos e introspectivos de toda a ópera, o Intermezzo Sinfónico.
Depois deste instante “meditativo”, tocam os sinos, a missa terminou.
Na hospedaria, Turiddu serve vinho aos presentes, mas Alfio recusa.
Os dois envolvem-se numa disputa e este último desafia-o para um duelo, desferindo-lhe uma ferida no lóbulo da orelha (método siciliano).
Antes de se dirigir para o local do duelo, Turiddu pede a Mamma Lucia que cuide de Santuzza como se fosse sua filha, mas não lhe explica a razão de tais palavras. Beija-a e despede-se.
Entra Santuzza, que a abraça.
Um grito rasga o silêncio da tarde, uma mulher anuncia a morte de Turiddu.


Na versão concerto que esteve em cena nos dias 3, 4, 6 e 7 de Novembro, o Teatro Nacional de São Carlos, inaugurou uma iniciativa que é a de Contar uma Ópera.
Beatriz Batarda foi a actriz convidada, para contar esta história. Começou por traçar em linhas muito gerais, a importância da orquestra e do coro. Situou o público perante os músicos e cantores. Depois, e antes de cada cena, fez uma breve introdução do que iria acontecer.
Entre o público, estavam muitas crianças, que escutavam atentamente as suas palavras.
É certo que esta é uma história verdadeiramente dramática, não dirigida para crianças, mas a verdade é que a inquietude normalmente habitual, própria de tão jovens espectadores, raramente se fez sentir.
O único senão, foi talvez a perda de intensidade.
Esta é uma ópera com árias de grande beleza e intenso dramatismo, é por isso que as pausas destinadas ao narrador (apesar de bastante úteis e contextualizadas) criam uma espécie de “corte” na própria música, interrompendo o processo sensitivo.
Emoção, beleza, sentimento é o que nos proporciona Cavalleria Rusticana. Extremamente melodiosa e harmoniosa não deixa indiferente quem a ouve.
Orquestra, coro e intérpretes contribuíram para criar um excelente momento musical.


Sobre o compositor - Pietro Mascagni (1863/1945)

Este compositor de grande versatilidade, foi um dos maiores compositores e maestros italianos da sua geração. Ficou famoso pelas óperas, mas também compôs canções, peças para piano e música orquestral.
Nasceu em Livorno – Itália, no seio de uma família da pequena burguesia.


Algumas datas importantes:


Em 1873 é enviado pelo pai para o liceu comunal de San Sebastiano onde estuda canto e piano. Mais tarde ingressa na Schola Cantorum da igreja local de San Benedetto e posteriormente no Instituto Musical de Livorno.
Em 1879 compõe diversos trabalhos, tais como: Sinfonia in do minore, Elegia, Kyrie, Gloria e Ave Maria.
Em 1881 recebe o 1.ºprémio num concurso em Milão, pela cantata: In Finlandia.
Em 1882 entra no conservatório de Milão onde estuda estética, literatura dramática, harmonia, contraponto, entre outras matérias. Nesse mesmo ano compõe: Cantata alla gioia (com texto de Schiller), La stella di Garibaldi e La tua stella.
Em 1884 compõe Ballata, M'ama non m'ama, Messagio d'amore e Alla luna.
Em 1885 abandona o conservatório para se dedicar à direcção de ópera.
Enquanto maestro, passa pelas companhias de ópera de Vittorio Forlì, Alfonso e Ciro Scognamiglio e Luigi Arnaldo Vassallo.
É também durante o ano de 1885 que compõe Il Re a Napoli in Cremona (romance para tenor e orquestra, com texto de Andrea Maffei).
Em 1886 torna-se mestre de música na Filarmónica de Cerignola .
Dois anos depois, em Fevereiro 1888 começa a trabalhar na Messa di Gloria.
Em 1889 a ópera mais famosa de Pietro Mascagni, Cavalleria Rusticana ganha a prestigiada competição da editora sonzogno. A estreia seria um ano depois, em 17/05/1890 no Teatro Constanzi, em Roma.
A recepção foi muito positiva e o sucesso imediato. A carreira de Mascagni estava lançada internacionalmente.
Cavalleria Rusticana é considerada a primeira ópera verista. O compositor transportou para esta ópera, o movimento literário do séc. XIX influenciado pelo naturalismo.
Ruggero Leoncavallo, autor de Il Pagliacci também foi precursor deste movimento conhecido como verismo (realismo).
Cavalleria Rusticana e Il Pagliacci são muitas vezes apresentadas juntas.
Entre 1891 e 1895, algumas das suas obras são estreadas, tais como: L'amico Fritz (que foi o segundo maior sucesso operático), I Rantzau, Silvano e Guglielmo Ratcliff.
Em 1895, Mascagni aceita a direcção do Liceo Rossini, em Pesaro e um ano depois, conduz a estreia de Zanetto.
Em 1898 dá-se a estreia de Iris no Teatro Costanzi (Roma).
Em 1900, Mascagni faz tournée por Moscovo e S.Petersburgo.
Em Janeiro de 1901 Le maschere estreia em vários teatros italianos.
Verdi morre nesse ano e Mascagni resolve celebrar a data da sua morte. Posteriormente dirige o requiem de Verdi, em Vienna.
Entre 1902/1903 faz tournée pelo Canadá e EUA (Montreal, New York, Philadelphia, Boston, S.Francisco.) A tournée foi um fiasco, à excepção de S. Francisco onde Mascagni foi muito bem recebido.
Em 1903 torna-se director da Scuola Musicale Romana. No mesmo ano, assina contrato com o editor francês Choudens.
Em Março de 1905 a ópera Amica (com libreto de Choudens) estreia em Monte Carlo e Le maschere estreia em Livornesse.
Em 1911 Pietro Mascagni cessa actividades na Scuola Musicale Romana. Algum tempo depois, parte para Buenos Aires, iniciando uma tournée de 7 meses pela África do Sul. Nesse ano, Isabeau estreia em Buenos Aires e em Itália (no Teatro alla Scala em Milão e no Teatro La Fenice em Veneza).
Em 1917 dá-se a estreia da ópera Lodoletta e da operetta Sì .
Em 1929 torna-se Director do Teatro alla Scala em Milão.
Em 1932 a ópera Pinotta é estreada em San Remo.
Durante este ano, Mascagni adere ao PNF (Partido Fascista), adquirindo o estatuto de “compositor do regime”.
Em 1935 Nerone é estreada em Milão.
Em 1940, em Itália celebra-se o 50.º aniversário da ópera mais popular de Mascagni: Cavalleria Rusticana. A ópera foi gravada para La Voce del Padrone no Teatro alla Scala de Milão, sob direcção de Mascagni, que gravou uma introdução especial falada. Mais tarde, a EMI reeditou a gravação em LP e CD.
Em Abril de 1943 Mascagni aparece pela última vez no Scala para dirigir L'amico Fritz.
Em 2 de Agosto de 1945, morre subitamente no seu quarto, no Hotel Plaza di Roma.
Em 1951, os restos mortais de Pietro Mascagni são transladados de Roma para Livorno, onde recebe uma homenagem oficial.

Pietro Mascagni compôs algumas dezenas de óperas, mas somente Cavalleria Rusticana e L’amico Fritz continuam no repertório musical mais utilizado.